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sexta-feira, 29 de março de 2019

DIREITO COMPARADO: Caso Burning Sun e Possíveis Penas aos Acusados

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Olá a todos (as). Esse post é um pouco diferente do que costumo trazer para este blog, haja vista que o direito a ser analisado aqui envolve o cunho criminal da Coreia do Sul e as possíveis penas que podem ser aplicadas ao caso. 

Para quem está acompanhando as notícias, é possível observar que o incidente no clube Burning Sun ocorrido em 28 de janeiro deu início a um conjunto de denúncias que envolve pessoas da mídia do entretenimento do país: Seungri (ex componente do Big Bang), Jung Joon Young, Choi Jong Hoon (ex componente do FT Island), Lee Jong Hyun (do CNBlue), dentre outros indivíduos não famosos. Desde então, vem sendo revelado pela mídia coreana (bem como internacional. Até mesmo o G1 noticiou sobre o assunto como visto aqui e aqui) a existência de um grupo de Kakao Talk no qual era divulgado vídeos de teor pornográfico gravado sem o consentimento das vítimas, relatos de entrega de suborno para policiais e supostos serviços de prostituição para CEOs. 

Por este resumo, portanto, é visível a quantidade de condutas ilegais cometidas e que estão sob investigação da polícia local. Tal é o volume de possíveis crimes que o portal Allkpop traduziu do Naver um artigo que falava sobre a possibilidade de Jung Joon Young ser sentenciado a sete anos e meio de prisão. Mesmo que não seja uma pena exata (já que a investigação continua em andamento e muito pode acontecer até um julgamento formal), vale a leitura para quem se interessar e quiser saber mais.

Inspirada nesse artigo, decidi mencionar os crimes imputados aos envolvidos até então e analisar as penas que podem ser atribuídas em cada caso, bem como hipóteses de diminuição ou exclusão de pena que a lei penal sul coreana permite.


PROSTITUIÇÃO


A prostituição é, sem dúvidas, um assunto delicado na Coreia do Sul. Apesar de ser uma prática ilegal, ela chegou a gerar 1,6% do PIB do país em 2010. Em 2004 foi promulgada uma legislação estrita para combatê-la mas, segundo Korea Herald, muito pouco foi alterado nesse sentido. 

De qualquer forma, a lei continua em vigor e possui vários capítulos regendo definições legais, proteção das vítimas, procedimento penal e as penas. 

Sobre as penas, o artigo 18 traz várias penas de acordo com a conduta o acusado podendo ser imputado até dez anos de prisão e pagamento de multa de até 100 milhões de wons (mais ou menos 344 mil reais) nos casos abaixo:
  1. Acusado se utiliza de violência ou ameaça;
  2. Uso de esquema enganoso ou outro meio equivalente;
  3. O acusado faz uso de relações de parentesco, emprego ou proximidade como vantagem para praticar o crime;
  4. Houve gravação de conteúdo obsceno por força ou através de uso de esquema enganoso.
Por outro lado, o réu pode ser punido com no mínimo um ano de prisão nos casos em que:
  1.  Praticou as condutas do parágrafo anterior e recebeu ou pediu promessa de recompensa, seja parcial ou total;
  2. Utilizou-se de juvenil ou pessoa que não tinha capacidade de determinação (doença mental, por exemplo) ou fraco discernimento (uso de bebida alcoólica ou drogas);
  3. Autor do crime como membro de organização ou gangue.
 Há a previsão de pena de, no mínimo, três anos de prisão se:
  • O acusado manteve vítima em cárcere privado ou exercendo poder de uma organização criminosa;
  • A vítima precisou se submeter a procedimento abortivo ou esterilização por esquema enganoso ou força através de sua posição superior (de emprego ou supervisão);
  • Acusado engajado em conduta de tráfico humano visando tráfico sexual.

Por último, há um parágrafo quarto que traz pena de no mínimo cinco anos de prisão quando:
  • O acusado tem a vítima sob sua proteção ou supervisão por relação de negócios, emprego ou outros tipos e vende serviços sexuais usando narcóticos;
  • Comete os crimes do parágrafo anterior como membro de organização criminosa ou gangue.
Fiz questão de traduzir as penas para que as pessoas possam ver que a prostituição vai além da pessoa se utilizar desse trabalho porque gosta. Há muitos problemas envolvidos como tráfico humano, uso de pessoas inconscientes para realização de atos libidinosos, esterilização e aborto forçados e envolvimento de crianças e adolescentes. É, como já mencionado, um problema delicado na Coreia do Sul e precisa prever penas para sua coibição (apesar delas serem apenas teoria em muitos casos por conta da corrupção existente no país).

A importância da tradução também serve para mostrar um pouco do quanto a investigação bem feita é importante. Através de documentos, depoimentos, perícias, dentre outros meios de prova, é possível o juiz determinar o período de pena que mais se aproxime do caso concreto; de como o réu praticou o crime. Por isso, especialmente em um caso de grande magnitude e interesse social, esses períodos demoram bastante para a própria segurança dos envolvidos.

Antes de finalizar a análise deste crime, gostaria de compartilhar dois artigos interessantes da mesma lei e comentar sobre eles. O primeiro é o artigo 22 que fala sobre o agravamento da pena pelo pertencimento a organizações criminosas. Ele diz:

Qualquer pessoa que tenha aparelhado  ou se juntado a uma organização criminosa ou gangue com o propósito de cometer delito (s) prescrito (s) no Artigo 18 ou 19 será punido de acordo com as penas referidas no Artigo 4 da Punição às Violências.
 Não se sabe até agora se as alegações de prostituição (principalmente do Seungri) se sustentarão no decorrer das investigações. Há pessoas que especulam seu envolvimento com mafiosos. Enquanto essa não se solidificar, porém, tratam-se apenas de especulações de cunho sensacionalista. De qualquer forma, é interessante como a lei reconhece a prática desses crimes por organizações criminosas especializadas e como tenta (na teoria), adequar-se juridicamente a esta realidade.

O segundo artigo é o 26 e dispõe sobre hipóteses de redução ou extinção da (s) pena (s) prescrita (as) nesta lei:

Quando uma pessoa que tenha cometido uma ofensa prescrita nesta Lei faz uma denúncia ou se entrega à uma agência de investigação, a punição relativa pode ser reduzida ou extinta.
Em outras palavras: havendo colaboração do agente durante as investigações nos crimes relacionados à prostituição, a pena pode ser reduzida ou até mesmo extinta. A lei não fala na extensão dessa diminuição, o que significa dizer que caberá ao juiz essa determinação.

JOGO DE APOSTAS

 

As investigações sobre o caso têm apontado para o envolvimento do Seungri em jogos de apostas. As práticas, segundo noticiaram, aconteceram quando o cantor estava em Los Angeles. 

Trata-se de um crime presente no artigo 246 do Código Penal Coreano com pena de até três anos de prisão e multa de até 20 milhões de wons (R$ 68 mil), caso seja habitual. Houve, inclusive, significativa manifestação judicial acerca do tema no caso da cantora Shoo, ex integrante do grupo S.E.S. Em janeiro ela havia sido acusada pelo cometimento do mesmo crime de forma habitual fora da Coreia. Ao decidir sua pena, a corte tomou em consideração a reputação da ré, a frequência e quantidade de apostas feitas (fonte). No fim, foi estipulada uma pena de seis meses na cadeia, com período de suspensão dessa pena de dois anos, além de 80 horas de serviço comunitário. São requisitos, portanto, importantes não só para esse caso, mas para outras acusações pelo crime.

Um ponto que pode suscitar dúvidas é o fato de Seungri ter, supostamente, jogado fora da Coreia do Sul o que poderia afastar a lei coreana neste caso. Entretanto, o artigo 3 do Código Penal é expresso em atribuir responsabilidade criminal a nacionais coreanos fora do próprio país. Então, mesmo que participem de atividades que no país que se encontrem sejam legais, poderão ser investigados e condenados na Coreia do Sul.

ESTUPRO


As conversas no Kakao Talk dos indivíduos revelam indícios de estupro, segundo veiculado pela emissora de TV SBS. Pela lei local, há dois artigos diferenciando o estupro de fato (quando a vítima [que a lei coloca expressamente como a mulher] é coagida a ter relações sexuais contra sua vontade por violência ou intimidação) e "quasi-estupro" (ocorre quando a vítima está inconsciente ou impossibilitada de resistir e o autor tira vantagem dessa situação). Em qualquer das hipóteses a pena é a mesma: mínimo de três anos de prisão.

Houve, entretanto, atualização legislativa sobre as penas envolvendo crimes sexuais, incluindo o estupro. Se cometidos após a mencionada atualização (ocorrida em 2012) o réu pode ser condenado a prisão perpétua ou por pelo menos cinco anos.

DISTRIBUIÇÃO E PRODUÇÃO DE FOTOS OBSCENAS


É o crime mais latente até então, do qual várias provas foram consideradas e houve, inclusive, a confissão de Jung Joon Young nesse sentido (bem como o reconhecimento da mesma conduta por parte do Seungri [fonte]).

Os artigos 243 e 244 mencionam as condutas de distribuição e produção de fotos obscenas como crimes. Apesar de serem ações diferentes, a pena é a mesma: até um ano de prisão e multa de até 5 milhões de wons (R$ 17 mil). Entretanto, a mesma atualização legislativa comentada acima também afeta crimes dessa natureza. Por isso, nos seus termos, quem distribuir, vender, prover ou exibir abertamente fotos desse teor enfrentará uma pena de até cinco anos ou multa que não excede 30 milhões de wons (podendo ser de 10 milhões de wons dependendo se o crime ocorreu antes da revisão legal).

CORRUPÇÃO PASSIVA/ATIVA


O crime de corrupção ativa também pode ser verificado através das conversas reveladas pela mídia. Segundo anúncio da polícia, o cantor Choi Jong Hoon ofereceu 2 milhões de wons para que seu estado de direção alcoolizada não fosse divulgado. A pena para quem promete, entrega ou manifesta desejo de entregar vantagem indevida é punível com até cinco anos de prisão ou uma multa de até 20 milhões de wons (artigo 133). A mesma penalidade se aplica a quem pratica as mesmas condutas com o propósito de cometer crime.

Por outro lado, a corrupção passiva ocorre quando o agente público aceita ou promete aceitar vantagem indevida em conexão com suas atividades. A pena é de até cinco anos de prisão ou suspensão de suas qualificações por até dez anos. 

CONCLUSÃO


Há muito o que ser investigado pela polícia. Trata-se de acusações sérias para os envolvidos e que devem ser tratadas com sobriedade pela mídia e, sobretudo, fãs. Por isso é essencial pesquisar fontes confiáveis e ter o máximo de conhecimento sobre o assunto em questão.

Não se pode, claro, confiar 100% no Judiciário. Há sempre brechas que podem ser usadas até mesmo na aplicação da pena. Porém, de qualquer forma, é necessário continuar aguardando e esperar que a justiça seja feita independentemente do que aconteça.

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