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sexta-feira, 1 de março de 2019

Considerações sobre a ameaça punível

 
 
Em ida ao Juizado Especial Criminal (JECRIM para os íntimos), tive contato com um parecer da promotoria acerca de um suposto crime de ameaça. No documento, o órgão pleiteava o arquivamento do pedido, pois as palavras proferidas não expressavam desejo de mal grave. No contexto a ameaça foi proferida pela seguinte frase: "não vai dar bom pra ninguém". Como o Ministério Público redigiria uma denúncia com esse teor?

Foi algo que me fez pensar. É inegável a atenção que deve ser dada a ameaças de forma geral. Tanto que é um dos crimes que compõe o Código Penal. Mas até qual ponto uma ameaça pode ser considerada como tal? Torna-se importante, portanto, um estudo e análise breve sobre este assunto.
 
Acerca do crime, o artigo 147 expõe o seguinte:
Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante representação.

Pelo tipo penal, é visível que não se pune apenas palavras, mas também escritos e gestos que possam passar a mensagem de futuro mal injusto e grave. Tenham total atenção a esta parte final. Se a ameaça for com o fim de realizar ato justo (se você não pagar o aluguel, irei despejar você) ou de natureza leve (não faço o trabalho pra você) não está caracterizado o crime.

Entrega de objetos sinistros pode ser considerada uma ameaça. Rogério Greco traz o exemplo de um vizinho que entrega a outro uma caixa contendo um pássaro com o pescoço quebrado. Neste caso, pode-se interpretar a mensagem como um acontecimento futuro à vítima.

Neste ponto, é também importante mencionar a ameaça usando-se meios supersticiosos como simpatias ou crendices (a popular "macumba"). Dependendo do entendimento do caso concreto pode sim ser considerado consumado o delito uma vez que traz temor e medo.

Frases que podem não ser consideradas como ameaça


  • "Vou fazer com que um raio caia em sua cabeça!": Ameaça impossível, pois um ser humano não tem essa capacidade;
  • Ameaças vagas como "isso não vai ser bom pra você", por exemplo. Porém, é importante frisar o contexto que pode tornar a frase amedrontadora;
  • Ameaça proferida em estado de ira ou cólera: abordagem polêmica doutrinariamente falando. Alguns estudiosos afirmam não ser crime, devendo ser consideradas "expressões jactanciosas" e desde que não revelem propósito de intimidar. Entretanto, há várias situações onde as palavras tornam-se ações. Por isso, é preciso mostrar a gravidade da ofensa e até mesmo as particularidades do autor do fato para ocasionar o processamento do crime.
  • Ameaça dita durante momento de embriaguez: Mais uma vez o doutrinador Rogério Greco explica que a embriaguez afasta o dolo da ameaça se "esta for ridícula", pois a embriaguez pode ser usada como meio de desinibir o agente.
É importante usar o bom senso e analisar a situação de maneira fria. Converse com terceiros (recomendado contato com advogado, conforme o caso), use outras perspectivas e tente não "tomar providências" (ir à delegacia, por exemplo) em momentos de raiva. Analise as palavras, contexto e autor para que sua queixa possa ser analisada com seriedade pelo Ministério Público. Isso porque, apesar da necessidade de representação do ofendido, o promotor(a) será aquele que irá ou não decidir pela denúncia.

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