
Olá a todos. Decidi escrever este post apenas a título de curiosidade e informação extra após assistir o filme "Memória de um Assassino". Trata-se de um filme sulcoreano de gênero policial que mostra a vida e paranoias de um senhor com Alzhaimer tentando lidar com a doença. O problema é que, durante sua juventude, ele foi um assassino em série e sua experiência faz com que ele desconfie do namorado de sua filha.
É um filme que te deixa bastante interessado, sem dúvidas. Há várias possibilidades e a forma com que o roteiro é traçado brinca com nossas expectativas. Lembrou-me bastante de Memento, dirigido por Christopher Nolan. Se é um estilo de produção que você gosta, então vai fundo porque há grandes chances de te surpreender positivamente.
Porém não estou aqui para fazer uma resenha da obra (ou contar spoilers de forma geral). Gostaria de, neste artigo, usar um olhar mais técnico e analisar três pontos que o filme pincelou sobre o direito penal e como ele funciona na Coreia do Sul. Afinal, a arte também serve como forma de aprendizado, seja direto ou indireto.
É um filme que te deixa bastante interessado, sem dúvidas. Há várias possibilidades e a forma com que o roteiro é traçado brinca com nossas expectativas. Lembrou-me bastante de Memento, dirigido por Christopher Nolan. Se é um estilo de produção que você gosta, então vai fundo porque há grandes chances de te surpreender positivamente.
Porém não estou aqui para fazer uma resenha da obra (ou contar spoilers de forma geral). Gostaria de, neste artigo, usar um olhar mais técnico e analisar três pontos que o filme pincelou sobre o direito penal e como ele funciona na Coreia do Sul. Afinal, a arte também serve como forma de aprendizado, seja direto ou indireto.
1. O papel da polícia nas investigações
É relevante notar o número de séries coreanas (os populares k-dramas) que possuem em sua temática a figura da polícia. Isso porque as histórias contadas nesses ambientes são instigantes, desde as cenas de ação quanto a investigação dos casos nos quais atuam.
Na Coreia do Sul (como em vários países democráticos), a atuação policial atua em conjunto com a promotoria e observando a legislação aplicável como na ocorrência de prisões, detenções, buscas ou apreensões. Trabalham nas áreas de segurança cibernética, segurança pública e na investigação criminal propriamente dita. No site da KNPA (Agência Nacional de Polícia Coreana, em português), há vários dados sobre investigação através de impressões digitais, exames genéticos, dentre outros relacionados aos os crimes em si.
É possível concluir, portanto, a necessidade da autoridade policial ser atualizada nos métodos de averiguação da materialidade e autoria de delitos e íntegra no seu proceder.
O filme não é tão focado nesta organização se comparado com outros de temática semelhante. Porém, é visível o quanto ela é importante para o cidadão, seja ele quem for.
2. Inimputabilidade do indivíduo com deterioramento mental
Esta temática é mais acentuada e pode levar o espectador a pensar: Byung-su (o personagem principal) poderia ser condenado como um criminoso normal por seus crimes tendo em vista sofrer de Alzhaimer?
O Brasil possui uma legislação penal baseada na teoria tripartite de crime. Em outras palavras, no nosso país, um ato ou fato é tratado como criminoso quando reune-se três pontos: a tipicidade, ilicitude e (o mais importante para nós) a culpabilidade. Para os leigos: a tipicidade ocorre quando a conduta praticada é descrita como crime na legislação. A ilicitude trata sobre a existência ou não de excludentes de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, etc). Por último, a culpabilidade atua observando o praticante da conduta, se ele tem discernimento dos atos que praticou e podia determinar-se com este entendimento.
Considerando esta premissa, no direito brasileiro, um indivíduo que comete uma conduta típica e ilícita pode ser considerado inimputável por possuir alguma doença mental ou desenvolvimento incompleto ou retardado. Nestes casos, há a chamada "absolvição imprópria", o que significa que a pessoa não cumprirá pena em um estabelecimento prisional mas em um hospital de custódia e tratamento psicológico.
Na Coreia do Sul, há uma tendência de analisar a condição mental do acusado para diminuição de pena. O artigo 10 da Código Penal do país possui um teor semelhante ao brasileiro. Afirma-se que:
Artigo 10 (Pessoas com Transtornos Mentais)
(1) O ato de uma pessoa que, por causa de transtorno mental, é incapaz de fazer determinar-se ou controlar-se, não deverá ser punido.
(2) pela conduta de uma pessoa que, por causa de transtorno mental, possui habilidades de determinação e autocontrole deficientes, ocorrerá em mitigação da pena.
Em 2016, um homem esfaqueou uma mulher que não conhecia até a morte, pois ele afirmava que "odiava mulheres". Após exames, foi confirmado que o homem foi diagnosticado com esquizofrenia desde 2008 e recebeu tratamento durante um ano antes de cometer o crime. Apesar da promotoria ter requerido prisão perpétua para seu caso, a corte o sentenciou a trinta anos de prisão. (fonte)
Por se tratar de uma obra de ficção, é difícil saber quais seriam as consequências, caso o protagonista fosse efetivamente julgado e condenado. Porém, observa-se o quanto a lei e prática jurídica da Coreia do Sul considera a existência de transtornos mentais e como eles podem afetar os réus.
3. Aplicação da Prescrição
Achei por bem apontar este como último tópico, até porque há um diálogo no filme que menciona o questionamento da existência ou não de prescrição dos crimes cometidos por Byung-su.
E o que seria prescrição? Basicamente, seria um prazo concedido por lei para que o Estado possa punir o acusado. No nosso Código Penal há vários prazos no artigo 109, que variam de três a vinte anos. Ou seja, se um indivíduo é acusado de homicídio, o Ministério Público tem vinte anos para iniciar o processo penal.
A legislação da Coreia do Sul sofreu algumas alterações nesse quesito. Primeiramente, a lei processual penal determinava uma prescrição de 15 anos para homicídios dolosos (ou de primeiro grau). Entretanto, em 2007, este prazo aumentou para 25 anos. Em 2015, por fim, a Assembleia Nacional alterou o dispositivo e removeu o prazo prescricional para esse crime. O objetivo, segundo noticiado, é o de possibilitar uma maior investigação para os casos frios. Este prazo, porém, não é retroativo, valendo para os homicídios ocorridos a partir da data de alteração da lei. Também não se aplica a homicídios de "segundo grau" (sem planejamento prévio), culposos e outras formas de acidentes que geram resultado morte. (fonte)
Voltando ao questionamento acima: Os antigos crimes de Byung-su estariam prescritos? Possivelmente sim. Estando em vigência a lei estabelecendo a prescrição em 15 ou até mesmo 25 anos daria tempo para haver a impossibilidade de sua punição pelo Judiciário.
Conclusão
O direito penal é, sem dúvidas, um dos ramos do direito que mais desperta fascínio e curiosidade. Cada país possui sua forma de dizer o direito, porém há sempre algumas semelhanças que ajudam na análise do direito comparado. E, mesmo sem objetivo pedagógico, estar diante de uma obra (seja um filme ou livro) que preza pela verossimilhança e por uma visão próxima a realidade pode mostrar lições e aprendizado para aqueles que a acompanham.
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